quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Seis da manhã

Meus pensamentos sempre voltam naquela noite, queria poder voltar no tempo. Não cometeria tantos erros e talvez estivéssemos juntos agora. Sei que me arrepender não o trará de volta, mas a cada dia sofro mais, não aguento os comentários nem os olhares... Estão todos comentando, todos já sabem o quão inconsequente fui. Mas não a nada que se possa fazer. Tento dormir, mas você não sai da minha cabeça, queria que um buraco se abrisse diante de meus pés para poder me esconder, me esconder da vergonha o do seu olhar. Sinto-me diante de um precipício e estou prestes a cair, será uma viajem sem volta, e quanto mais olho pro abismo, mas vejo você se afastar de mim ... Agora você some na multidão e por mais que grite e peça perdão você não pode me ouvir. Esta com os seus malditos fones de ouvido.
Respiro e conto de um até três, fecho os olhos e imagino um mundo onde eu posso me controlar e meus hormônios adolescentes não me comprometem. Saio e me divirto, volto pra casa e tudo continua bem. No dia seguinte te encontro e você me beija e eu vejo o quanto sou feliz, mas tudo muda quando o despertador toca. São seis da manhã, de volta á realidade, de volta pra escola.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Despedida

E no meio dessa confusão alguém partiu sem se despedir; foi triste. Se houvesse uma despedida talvez fosse mais triste, talvez tenha sido melhor assim, uma separação como às vezes acontece em um baile de carnaval — uma pessoa se perda da outra, procura-a por um instante e depois adere a qualquer cordão. É melhor para os amantes pensar que a última vez que se encontraram se amaram muito — depois apenas aconteceu que não se encontraram mais. Eles não se despediram, a vida é que os despediu, cada um para seu lado — sem glória nem humilhação.
Creio que será permitido guardar uma leve tristeza, e também uma lembrança boa; que não será proibido confessar que às vezes se tem saudades; nem será odioso dizer que a separação ao mesmo tempo nos traz um inexplicável sentimento de alívio, e de sossego; e um indefinível remorso; e um recôndito despeito.
E que houve momentos perfeitos que passaram, mas não se perderam, porque ficaram em nossa vida; que a lembrança deles nos faz sentir maior a nossa solidão; mas que essa solidão ficou menos infeliz: que importa que uma estrela já esteja morta se ela ainda brilha no fundo de nossa noite e de nosso confuso sonho?
Talvez não mereçamos imaginar que haverá outros verões; se eles vierem, nós os receberemos obedientes como as cigarras e as paineiras — com flores e cantos. O inverno — te lembras — nos maltratou; não havia flores, não havia mar, e fomos sacudidos de um lado para outro como dois bonecos na mão de um titeriteiro inábil.
Ah, talvez valesse a pena dizer que houve um telefonema que não pôde haver; entretanto, é possível que não adiantasse nada. Para que explicações? Esqueçamos as pequenas coisas mortificantes; o silêncio torna tudo menos penoso; lembremos apenas as coisas douradas e digamos apenas a pequena palavra: adeus.
A pequena palavra que se alonga como um canto de cigarra perdido numa tarde de domingo.


Extraído do livro "A Traição das Elegantes", Editora Sabiá – Rio de Janeiro, 1967, pág. 83.
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